segunda-feira, 27 de agosto de 2007

Na Grafonola do Marsupilami com os Organic Anagram

Os Organic Anagram são um projecto no mínimo, interessante. Quando a maior parte das pessoas ocupa a madrugada a dormir, Miguel Meruje, a força criativa por detrás dos Organic Anagram, sentiu necessidade de ocupar algumas dessas madrugadas, de uma outra forma! Foi assim que começou a desenhar-se este projecto que com o tempo, passou de algo para ocupar o tempo, a algo mais sério, onde as pessoas pedem, exigem mais, e mais… O Marsupilami quis conhecer melhor este projecto, e por isso mesmo esteve á conversa com, Miguel Meruje. A conversa frontal e sem rodeios, segue já de seguida…

Antes de mais obrigado Miguel Meruje,e aos Organic Anagram, por aceitares a responder a algumas perguntas que gostava de te fazer. Obrigado

Quando e como é que os Organic Anagram começaram? E qual era o objectivo na altura?

Olá Marsupilami., obrigado eu. Deixa-me primeiro agradecer-te por este teu espaço, é genuinamente interessante, e acho que o facto de dares destaque a bandas de diversos quadrantes musicais é fantástico, espero que o Marsupilami continue a aumentar a cauda.
Quanto a Organic Anagram, começou com uma banda de tributo a Burzum, mais concretamente ao álbum Filosofem, e dentro da mesma estética sonora. O objectivo foi ocupar algumas horas da madrugada que tinha sozinho, e a minha mente começava a "pregar-me partidas". É desesperante tu teres noção que começas a não ter controlo sobre o que se passa na tua cabeça, e mesmo assim não consegues fazer nada para te tirar desses quadrantes mentais. Organic Anagram foi a maneira de me distrair, o meu subterfúgio.

Sinto uma grande curiosidade em como é que os Organic Anagram funcionam, tanto a nível de ensaios, estúdio, até á fase de concertos. Podes me explicar como é que tudo funciona? E até que ponto este projecto pode ser considerado como uma banda?

Organic Anagram representa uma ideia. Acabamos por ser cinco pessoas com nomes muito parecidos, e acho que é isso que nos une, na falta de algo mais inventivo. Já dei concertos sozinho, mas deixei-me disso, não vale a pena estar a deslocar-me para ter as pessoas a olhar para mim como se fosse um recital de ópera. Sabes, até a música clássica, no seu propósito inicial era uma coisa para o povo, onde toda a gente estava de pé, dançava. Infelizmente esses hábitos nunca se enraizaram cá em Portugal, acaba por ficar tudo com vergonha. Se eu tivesse um convite onde ia saber que as pessoas mal ouvissem um break iam logo começar a trepar paredes, e tudo a divertir-se, aí tocava mais vezes.
Pode ser considerado uma banda, no ponto em que, como anteriormente referi, é uma ideia. São os meus amigos, são as miúdas do Myspace que me mandam desenhos inspirados pela música, são as pessoas que não compreendem. Tem de haver algo para criar este tipo de emoções, penso que seja uma banda.

Os Organic Anagram já têm um EP lançado, o”Despair And Solitude” e está prestes a lançar o seu álbum de estreia. Como tem sido o feedback ao vosso trabalho?

A mim surpreende-me. Eu vou-te ser honesto, são raras as bandas que eu oiço no myspace, no entanto estou sempre a receber mensagens, as pessoas dizem-me que gostam. Quando esse Ep foi lançado, eu mandei o link por mail, para que uns amigos sacassem-se, e até miúdas que gostam é do que dá na rádio me disseram “Nunca tinha ouvido nada parecido, é estranho, mas é interessante”. Por outro lado, gosto quando as pessoas se identificam com a música, mas eu acabo por fazer musica para mim. Quando faço uma música, oiço-a dezenas de vezes, fico mesmo contente por ter conseguido finalizar uma peça e ser produção minha.

Já há data prevista para o lançamento do vosso álbum “London By Night”? E que nos trazem com esse álbum? Alguma coisa que queriam adiantar…

O álbum está pronto desde Maio, se a memória não me falha. Já vi uma proposta de artwork da editora, e não sei se estava correcto, mas lá ainda estava 2007. Penso que será por volta de Novembro, eles têm uns lançamentos antes, é uma questão de esperar na fila. Acho que quem se prestar a ouvir o ‘London By Night’, deve-o fazer com atenção e do princípio ao fim. De certa maneira acabam por ser uma viagem, não é conceptual, mas tem um conceito, são várias correntes sonoras que se ouvem na Londres urbana de hoje em dia. Ainda continua a ter aquela onda noise/ambient do Ep, mas agora há músicas de dubstep, breakcore, muitas guitarras, contrabaixo, e por ai fora. Numa música que compus ao piano, tenho também o Pelbu a ler umas coisas bem negativas. Devem ouvir as bandas dele, Knuckledust, Bun Dem Out e Injury Time, parece que põe um selo de qualidade com a voz.

Onde vão buscar a inspiração para as vossas músicas, o vosso trabalho?

É por me sentar e o trabalho começa a fluir. Tudo o que se passa numa cidade tão multicultural como Londres, o ódio, a indiferença ao próximo, o desinteresse pelas especificidades de cada um. É um mundo frio e caótico, é assim esta música também.

O que querem dizer a todos aqueles que vos ouvem, com o vosso trabalho?

Não há nenhum movimento secreto, é só as pessoas sentarem-se, perderem 50 minutos a ouvir o álbum com atenção, que talvez lhes serve de plataforma para terem ideias e serem criativos. Querem descobrir o significado da vida, injectem heroína, juntem-se a um culto, eu não sou capaz de dar um sentido à vossa vida, definitivamente.

Têm sentido dificuldade em divulgar o vosso trabalho? E como é têm feito?

Nem por isso. Consigo ter convites para lançar coisas minhas, há vária gente a conhecer Organic Anagram por todo o mundo, de várias idades. Inclusivamente, já vi dois profiles feitos em sites que não sei quem fez. Há o myspace www.myspace.com/noiseanagram, há um vídeo no youtube, há também o que as editoras lançam (Enough Records e Test Tube Label), há o óbvio passa-palavra. Também faço muitas cópias físicas dos CDs, que personalizo e depois dou a músicos que admiro, deixo em lojas de música, dou a miúdas giras na rua.

Sei que vocês disponibilizam o vosso trabalho para donwload gratuito, mas… Qual a vossa opinião em relação á música vs net, e á consequente partilha/pirataria que se vive hoje em dia?

Penso que aquelas pessoas que gostam de comprar musica, vão sempre comprar. O problema dos CDs foi sempre terem um preço desfasado do justo, deviam custar entre 3 a 5€, é um preço que dá margem a grande lucro, mesmo assim. Não tenho pena das majors que fecham, sempre exploraram toda a gente, está na altura de eles andarem a rastejar às portas, a pedir emprego. Como amante do vinil, penso que essa cultura estará salvaguardada, nunca irá desaparecer, mas as netlabels são o futuro. Aquelas que trabalham comigo, eu vejo que não têm lucro nenhum, e no entanto estimulam músicos de todo o mundo, dão-lhes uma casa e uma plataforma para mostrarem as músicas. Se não fosse a Enough e a Test Tube, eu não estava a escrever isto, tão simples como isso. Eu gostava de lançar um trabalho cuidado, por exemplo com um livro como apêndice ou assim, mas ninguém vai arriscar essa ideia, e não sou eu que vou andar feito desgraçadinho a pedir ‘as editoras para me ajudarem.
Eu cresci com a pirataria, eu ligava o Audiogalaxy e o Napster, ia para a escola, e quando voltava, tinha ali as músicas à espera de serem ouvidas. Continuava a comprar vinys e CDs com a minha mesada, mas se calhar passei a interessar-me por outros estilos que não eram ‘prioritários’ quando gastava a mesada, mas que gratuitamente gostava de ouvir (e provavelmente depois passava a comprar os CDs). Há este clima todo de medo, porque as editoras perdem dinheiro, mas a musica nunca esteve tão saudável, basta ver a quantidade de concertos que existem. A dar uma de futurologista, penso que o futuro vão ser as netlabels para dar a conhecer o trabalho, e os concertos para nos divertirmos com músicas que gostamos e dar dinheiro aos músicos, pelas entradas e pelo merch.

Vivendo grande parte do ano em Inglaterra, que diferenças existem entre Portugal e Inglaterra a nível musical?

Em Portugal é um cenário desolador no que consta ‘a musica. Para começar, a mim mete-me um certo nojo aquele pessoal que acha que é muito alternativo ou indie, ou lá como lhe chamam, mas a única coisa que faz é copiar o que está na berra em Inglaterra. Não suporto a falta de personalidade, o ter de usar uma fórmula eficaz para se tornarem conhecidos. Esta banda existe pela arte, pelo DIY, não para ter miúdas aos meus pés.
Outra grande diferença, é o “separar de águas” que existe cá em Portugal. Em Londres, qualquer miúdo de 16 anos vai a festas de drum ‘n bass, ouve funk enquanto está com os amigos, e usa t shirts de grime, por exemplo. Cá parece que assinam contracto vitalício e recusam-se a explorar mais. Se calhar está relacionado com a pouca oferta, e o poder de compra, mas eu também cresci no mesmo e arranjei maneira de me desenrascar.

Qual é a tua opinião em relação ao panorama actual musical português?

Acho que houve muita gente a conseguir furar para circuitos maiores, com mérito e a apresentar um produto de qualidade. Obviamente também se sucede o reverso, bandas que levam com hypes em cima por serem do compadrio e que acabam a subir nos line ups. Se examinarem duma perspectiva simplista, qualquer dessas bandas “do hype”, toca uma nota e fica logo tudo maluco. Se fosse uma banda boa a ter essa oportunidade, esses sentimentos só eram amplificados. O panorama editorial já se sabe como é. Chato, quem tem dinheiro e amigos safa-se, quem não tem, acaba por “morrer na praia”, tal é o desalento que se sofre pelo desinteresse.
Para te ser honesto, não estou muito importado com isso, os meios onde me movimento são afastados do dito “panorama musical português”, não preciso de estar associado a essa gente para nada, só servem para bloquear caminhos. Espero que sufoquem no próprio lixo que produzem.

E em relação ao estado actual do país?

Não é muito animador. Tal como na música, se eu fosse a “misturar-me” com o país real, suicidava-me. Tenho uma visão muito negativista, deprimo-me com o mal alheio, por isso tenho de me distrair e ocupar-me no meu próprio mundo. Nasci em Viseu, cresci na rua e envolvido na cultura de rua, mas tenho uma grande proximidade com o meio rural. Se fores para o meio da cidade, ninguém tem dinheiro para nada, toda a gente lisa, as casas ‘a venda porque não aguentam os juros. Vou andar de bicicleta para as aldeias, e numa tarde vejo 20 ou 30 mansões em construção.
Outra coisa que me faz impressão, é ninguém ter dinheiro, mas telemóveis, cigarros, café, ir de carro para o emprego, televisão por cabo, são tudo bens de primeira necessidade. Vais a ver, se for preciso passam fome ou não podem ir sair ao fim de semana com a família, porque falta dinheiro para a gasolina, não podem oferecer nada a ninguém porque já compraram cinco maços de tabaco essa semana. Lamento por aqueles que estão no fundo da escala social, toda a gente merece as mesmas oportunidades.
Quanto ao papel do governo, acho que torna o país paradisíaco. Ninguém chateia ninguém, cada um faz o que quer, as ruas são relativamente seguras. Costumo dizer que adoro Portugal enquanto turista, mas não era capaz de viver cá, por causa das pessoas. Demasiada inveja, só estás realmente bem, se tu estiveres bem, mas o teu vizinho mal. Não fui educado assim, não vivo por isso.
Queixamo-nos demasiado, mas estamos livres de muitos males do mundo moderno. Em vez de ir para o Brasil, devíamos tirar as férias para explorar as Beiras, Trás-os-Montes, o vale do Douro, a costa e o interior Alentejano e afins. Mas lá está, isso não dá status.

Para além do lançamento do vosso álbum, quais os próximos passos dos Organic Anagram?

Em Novembro vou voltar a escrever musica. Quero ter um som mais majestoso, com mais impacto. Espero que o álbum tenha uma boa recepção, para sentir que tenho gente a prestar atenção ao que é feito. Gostava de me juntar a alguém em Portugal para ter Organic Anagram em duas frentes. Contactem-me!

Uma última pergunta, qual a tua personagem de banda desenhada favorita?

Lamentavelmente, não posso dizer que seja o Marsupilami, apesar de ser sem duvida o meu marsupial de eleição eheh. Cresci com o Tintim, Peanuts, depois meti-me no mundo dos Manga, mas penso que a minha preferida seja o Tinny Sepuku, é uma criaturinha tão adoravelmente inteligente.

Curiosidades:

Porquê o nome Organic Anagram?

É um excerto duma letra da minha banda favorita, Meshuggah. Está na “New Millenium Cyanide Christ”, e é qualquer coisa como “I am a carnal organic anagram, human flesh instead of written letters”. Acho fascinante o conceito de pessoa enquanto anagrama orgânico.

Instrumentos que utilizam nas vossas músicas?

Guitarra, baixo, voz, o que consiga encontrar no computador, Micro Korg, e ocasionalmente também samplo breaks e rearranjo-os depois de desconstruídos.

Influências?
True Norwegian Black Metal, Portugal, a vida nos council states de Londres, a segregação, Venetian Snares, supermodernismo.

Bandas nacionais que costumas ouvir?

For The Glory são a única banda portuguesa, que apesar de incluídos naquele subgénero underground, conseguem ser relevantes a nível Europeu. Gosto de A Naifa, do José Mário Branco, dos Gaiteiros de Lisboa, Carlos Paredes, Blacksunrise, daquilo que o Kubik faz, Men Eater, Madredeus. Depois há o hip hop, que agora parece ter voltado a estar na moda cá, desde miúdo que gosto de Nigga Poison(antigos), TWA, Chullage, Sam The Kid, Valete, do meu mano Kilu, Halloween, Kosmikilla e por ai fora.
Acho interessante o que se anda a passar em Leiria/Marinha Grande, Braga e outros ‘focos’ de criatividade, espero que continuem a desenvolver-se ideias desse pessoal. Se gostam de punk rock, os meus rapazes All Against The World vão lançar agora um álbum que vai virar muitas cabeças, tal como o novo de For The Glory. Por fim, vão a http://enoughrecords.scene.org/ e a http://testtube.monocromatica.com/ , muita musica boa e gratuita.

Myspace dos Organic Anagram

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